quinta-feira, 18 de setembro de 2008
Licença Poética: da terra nobre da Rainha ao solo sagrado dos Papas
No topo do Vittorio Emanuele II, em Roma
Vaticano
Nós, em Bérgamo
Vista da Ponte do Rialto em Veneza
Numa ponte em Veneza
Brasileiro que está em UK nunca se satisfaz e quer sempre dar uma "esticadinha" mapa afora. Isso porque quem está por aqui tem sempre a impressão de estar meio deslocado: o dinheiro é a Libra, não o Euro; o motorista dirige do lado esquerdo, não do direito e estamos de fato, ilhados por água de todos os lados. Assim, este post é uma licença poética, um respiro de brasileiro, que trocou a Coroa por uma Bota, numa semana de setembro...
Sempre tentando economizar, planejei a viagem com bastante antecedência. As passagens de avião, trem e ônibus, bem como as diárias em hotéis acabam custando significativamente menos dessa forma. Os hotéis, eu reservei pela internet, utilizando o perfeito site Booking.com e as passagens eu comprei pela Rynair, Manchester - Bergamo, por 10 Libras ida e 52 Libras volta. Mas para isso, precisei comprá-la 2 meses antes da viagem, levar apenas bagagem de mão (apenas 1 volume e 10 kgs no máximo, pois para despachar bagagem se paga e o excesso de peso custa 15 Libras por quilo extra!), abdicar do seguro-bagagem (que cobre extravios), seguro reembolso (caso perdesse o vôo) e um pouco da minha auto-estima, porque sendo uma típica Low Cost, a Rynair não oferece nem água durante o vôo, tem assentos mais espremidos do que o padrão de classe econômica e não marca os assentos.
O roteiro foi enxuto: Bérgamo, Veneza e Roma, em 6 dias. Bérgamo é uma cidade linda, no alto das montanhas, ao norte da Itália, perto de Milão. Por isso, optei por ficar por lá ao invés de ir para sua vizinha cosmopolita. O aeroporto Orio Al Serio fica a 10 minutos da ferroviária e a 45 minutos de Milão. A cidade é divida em Città Alta e Città Bassa. A Alta é medieval, cercada por muralhas, cheia de ruinhas estreitas de pedra e lindas construções que datam do século XIII. A Baixa é moderna e vive bastante em função da parte alta. É possível ficar a pé, apesar das escadarias judiarem dos físicos mais bem preparados, mas a tortura compensa, e o que se tem ao chegar ao topo é uma vista impressionante, um sem-horizonte de tirar o fôlego, ou aquilo que restou dele.
Como dormi apenas 1 noite em Bérgamo, preferi pernoitar num hotel ao lado do aeroporto e conseqüentemente, da ferroviária. O lado bom é que economizei no taxi, ganhei tempo, dormi num hotel excelente e, na volta para Manchester, 5 dias depois, tive onde deixar a bagagem o dia todo para poder passear antes de ir para o aeroporto. O lado ruim é que nesta localização os hotéis são mais caros, e paguei 134Libras por 1 noite no Hotel Mercure (30% mais em conta porque reservei com muita antecedência e optei arriscar pela diária Non-Refundable e paga no ato da reserva.
De Bérgamo, tomamos o trem para Veneza (26 Euros por pessoa), que fica a 3 horas dali. Por milagre, as passagens para este trecho eu consegui comprar pelo site da Trenitalia com antecedência e isso poupou tempo e filas na estação, mas os outros, eu tive que comprar na estação, porque o site da Itália é péssimo e dificilmente completa a compra sem expirar. Também é preciso ficar muito atento nas estações, porque os tíquetes devem ser validados em pequenas máquinas amarelas antes do embarque, que por sua vez é confuso, pois os "Binários" (plataformas) mudam toda hora e isso só é anunciado em italiano, (quando é anunciado!)
Uma dica importante: desista de querer ir ao banheiro na Itália; o que se tem por lá em muitos lugares é o banheiro turco, ou seja, um simples furo no chão! É um terror mesmo, então o melhor é não beber nada na rua para não passar aperto depois, ou apelar para as intermináveis filas do Mc Donalds, se tiver a sorte de encontrar um por perto!
Chegando a Veneza, prefira descer na estação Santa Lucia, que é bem central. Uma opção é ficar em um hotel bem próximo dali para não precisar circular com a bagagem pelas ruinhas estreitas e lotadas, escadarias intermináveis e pontes gigantescas da cidade. Eu fiquei num hotel/albergue excelente: Residenza Ca’Dario, que fica a 5 minutos da estação e a 10 da Piazza San Marco. Não foi preciso tomar nenhum ferry ou vaporetto para me deslocar por tudo e ainda foi uma estadia aconchegante e econômica (95 Euros pelo quarto), porque Veneza é caríssima!
Nem é preciso divagar sobe esta cidade de sonho que é Veneza. Um lugar que parou no tempo, onde os canais, gôndolas, pombas, máscaras, música, pontes, igrejas, restaurantes, vielas labirínticas e luzes inspiram paixões e histórias Shakespearianas. Para turistas mais ágeis (e sem grana), 1 dia em Veneza basta para conhecer as principais atrações. Para os mais requintados, 2 dias são o suficiente. Mas é fundamental passar por lá, porque a cidade está mesmo afundando e há pontos que já estão alagados continuamente, independentemente da estação do ano.
Uma sugestão para a hora em que a fome bater: evite pedir o Menu Turístico, que cobra em média de 15 a 23 Euros por pessoa, incluindo (entrada, prato principal, sobremesa e uma bebida. Pode parecer uma boa alternativa, mas em geral eles são bem ruins e mal servidos.
Depois de Veneza, seguimos para Roma, porque é lá que está o berço de toda a história do Ocidente; e eu penso que é conhecendo nossa história que entendemos o nosso presente. A viagem de trem deste trecho (Santa Lucia – Roma Termini) é operada pela Eurostar, não pela empresa regional, então custa mais caro (59 Euros por pessoa), mas vale a pena pelo conforto, pelo banheiro, vagão restaurante e organização. Em Roma, ficamos na casa de uma amiga, então aproveitamos essa economia e gastamos para comer bem, porque em Veneza comemos bem mal...
Tudo em Roma é estupendo. As proporções das construções nos devolvem a clareza de nossa insignificância e remetem a um passado de glórias e conquistas, ostentadas nos magníficos monumentos que definem a cidade eterna. Com um mapa em mãos e algumas dicas é possível conquistar Roma em 2 ou 3 dias. O sistema de transporte é ruim (pelo menos, se comparado com o de UK); para andar de ônibus é preciso ir a uma Tabacaria (detalhe: abrem tarde e fecham cedo!) comprar os tíquetes, depois validá-los, porque sem isso, se sujeita a pagar uma multa de mais de 50 Euros, caso se depare com um fiscal.
O fundamental para fazer a sua conquista de Roma é tomar a Via Del Corso, que está na parte antiga da cidade (cercada pela muralha) e explorar cada quarteirão ao longo de seu comprimento, com a certeza de que se surpreenderá a cada esquina. O Pantheon, a Piazza Espagna, Piazza Del Popolo, Piazza Navona, Piazza Venezia, com o esplendoroso monumento a Vittorio Emanuele II, o Campidoglio, o Fórum Romano, o Coliseu, a Boca Della Veritá e até o pitoresco bairro Trastevere, podem ser explorados a partir desta via. O Vaticano, com seus Museus, incluindo a Capela Sistina, e a Basílica de São Pedro, ambos com filas intermináveis ficam um pouco mais distantes, mas com fé e força, é possível chegar lá a pé, como nós fizemos. Se a idéia for ver o Papa, saiba que ele só reza para o povo às quartas-feiras, na parte da manhã.
Quem pensa mesmo em economizar, pode tentar dormir no trem de Roma para Bergamo, mas desaconselho! Fizemos isso, mas como o trem que operava a rota era o regional, dividimos a cabine com mais 4 pessoas, tivemos que fazer 2 baldiações atrapalhadas e chegamos derrotados pelo cansaço. A viagem custou 36 Euros na segunda classe. Na primeira é o dobro. Em Roma há hotéis para todos os bolsos, então pode-se garantir uma estada digna para encarar a viagem sem roncos e com belas paisagens no dia da volta.
Nestes dias de Itália, após uma overdose histórica, conclui que a terra dos Papas tem o poder de abafar um pouco da realeza de UK e o brilho da Rainha. Mesmo adorando estar em UK, com toda sua organização, limpeza, tradições e ordem, tenho que assumir que o caos, todas as cores, o clima, as vozes gritadas do povo, as fontes, os monumentos, todo o passado-vivo da Itália, apesar da era Berlusconi (que deve fazer Júlio César remexer na tumba pelo abandono em que ele tem deixado o País e o povo), ainda apaixona multidões e faz este país encantador reinar absoluto entre os meus destinos preferidos no mundo!
Sem palavras, na Fontana di Trevi!
terça-feira, 9 de setembro de 2008
Com Londres, no divã!
Eu e os escoceses no Regent Square Festival
Carnaby Street
Regent Square Festival
Pode parecer estranho que somente após 26 postagens em três meses de UK eu me habilite a escrever sobre Londres. O fato é estava esperando viajar até lá pela quarta vez na vida para sentir-me suficientemente confiante do que escreveria sobre a cidade mais cobiçada do Reino Unido.
Aconteceu que mesmo após minha quarta estada, percebi que não tenho competência para fazer isso com propriedade. Percebi também, que Londres não se resume num texto, ela se prolonga em infindáveis reticências. Londres não se desvenda em palavras, fotografias, guias; ela se insinua. É uma cidade que não se encerra em discursos, porque está em constante transformação. A única lei que parece servir para Londres é a do Samsara, conceito budista que prega que “a única constante é a eterna mudança”.
Assim, na condição de psicóloga, tentei ao menos compreender Londres, colocando-a no divã para analisá-la à luz de quem talvez me trouxesse algumas explicações...
Londres é bipolar: tem surtos de euforia, com festas badaladíssimas , parques cheios de verde e vida; premières de filmes no Odeon Leicester Square Cinema, (como a de Sex and City e Batman, entre junho e julho), tributos a personalidades mundialmente famosas, como o aniversário do Mandela no Hyde Park, em julho; sedia campeonatos e shows no grandioso Wembley Stadium, oferece museus gratuitos incríveis, como a National gallery, na linda Trafalgar square. Também é praticamente inteira acessível por metrô, facilitando deslocamentos rápidos e com menor impacto ambiental. Isso sem mencionar a arquitetura imponente, que combina tão bem o velho e o novo, como faz a ponte do milênio, interligando a Saint Paul Cathedral com a Tate Modern Galery. Por outro lado, Londres é uma cidade caríssima. Carros pagam a “congestion charge” para circular no centro e pessoas pagam quase o dobro pelo tíquete de metrô diário se viajam antes das 9h30 (é a “congestion charge” das pessoas...). Os problemas de segurança têm aumentado, a inflação e o desemprego também.
O ritmo da cidade é alucinante. Londres é hiperativa. Pessoas circulam em todos os lugares, a qualquer horário, seja por turismo, ou por trabalho. O consumo é incessante, lojas imensas, como a Harrods, a Primark e John Lewis estão sempre lotadas de gente comprando. O trânsito é caótico, o metrô é abarrotado, confuso, claustrofóbico...
Londres é psicótica. Tem múltiplas personalidades. Quero entender o que a cidade nos diz, mas ela fala muitas línguas. Quero entender seu comportamento, mas ela se comporta paradoxalmente. Na Brick Lane, a rigidez da cultura mulçumana, na Oxford Street, o consumismo cosmopolita; no Soho, a descontração das baladas e casas GLS; na City um clima de futuro; em Nothing Hill, um link com o passado.
Londres é paranóica, tem delírios de grandeza. Anúncios de segurança alertam sobre suspeitos de terrorismo; câmeras flagram cada passo que se dá... Todos são suspeitos até que se prove o contrário. E esse clima de que podemos ser o próximo Jean Charles, oprime um pouco.
Londres é obsessiva, perfeccionista. Não sossegou até conseguir sediar as Olimpíadas de 2012. Agora se mobiliza em obras e restaurações, querendo fazer mais bonito do que a China, onde brilhou nas competições.
Londres é sedutora, é narcisista. Ela sorri para nós com malícia, sabendo que mesmo com todas sua neuroses, seus caprichos e problemas, vamos nos apaixonar. Ela nos olha de cima, com ares de nobreza, querendo que ajoelhemos a seus pés num ato de reverência. Ao mesmo tempo, nos quer longe de sua essência, quer manter-se intacta e inatingível; de preferência a idolatrando a milhas de distância, com nossos passaportes não-britânicos, apreciando platonicamente sua beleza, suas raízes, seu sotaque real.
Foi assim, nesse impasse entre o desejo e a impossibilidade de captar a sua essência, que Londres virou o jogo e me hipnotizou. Sinto que a cada vez que pisar em seu solo Real, ela vai me dominar novamente e me fazer sentir que sou só mais um entre seus súditos apaixonados. E ciente de ser para sempre apenas voyer de sua beleza, impotente e frustrada na missão de analisá-la, eu me rendi. Deitei-me ao seu lado no divã e percebi que entender esta cidade é mesmo uma tarefa vã!
Ponte do Milênio
Olla no Wembley - Soccer Aid
quarta-feira, 3 de setembro de 2008
Oxford: só pra quem pode!
"Bandejão de Oxford": cenário de Harry Potter e palco dos almoços com reza em latim!"
A 4 horas de Manchester (via Megabus)**, um encontro com o surreal... No centro-sul da Inglaterra, enfeitando o mapa da Grã-Bretanha, situa-se a mágica cidade de Oxford.
Com uma população de aproximadamente 200.000 habitantes, a cidade que deu nome ao tradiconal dicionário da língua inglesa é difícil de ser definida e faltam palavras para traduzir o sentimento que ela evoca naqueles que a visitam:
Medieval e ultra moderna; berço de figuras célebres que marcaram a história e fomentadora de gênios que estão ainda por vir. Imortalizada em diversos filmes, tornou-se famosa por sua fervilhante vida acadêmica e ostenta a mais antiga universidade de língua inglesa, considerada uma das 5 melhores universidades do mundo: a Universidade de Oxford.
Tamanha fama fez de Oxford um imã turístico em UK. Um erro comum cometido pelos turistas é procurar por um campus da Universidade. Na verdade, a Universidade fica espalhada pela cidade em cerca de 40 Colleges. Dentre os mais antigos e famosos, encontram-se Magdalen College, New College, Christchurch, St. Johns, Brasenose e All Souls. Entre os alunos destacam-se presidentes, estadistas, estudiosos, cientistas, escritores e ganhadores do Prêmio Nobel. Nomes como Bill Clinton, Tony Blair, J. R. Tolkien (autor de O Senhor dos Anéis), Edmund Halley, que deu o nome ao famoso cometa, Robert Hooke, Lewis Carroll (Alice no País das Maravilhas), Benazir Bhutto (que foi assassinada recentemente), Manfred von Richtofen (o Barão Vermelho) e Oscar Wilde figuram entre os mais célebres.
É em Oxford que além de gênios, também nascem as águas do Tâmisa, nomeado alí de Ísis River. Em seu curso, caiaques; em suas margens moradias estudantis, pontes, patos, parques, pubs... Desenhando um encontro entre o passado e o presente, o real e o sonho; uma atmosfera enfeitiçada à Harry Potter, que encantam todos os que se aventuram por lá!
É possível ficar tranquilamente a pé pela cidade, porque tudo é bem concentrado e há mapas sendo distribuídos a cada esquina; por isso, vale perder-se sem medo... Andar pelas ruas estreitas e deparar-se de súbito com os colleges é o máximo. Por fora, sempre uma bela e sisuda fachada, mas que após adentrar por seus modestos portões, perde-se na visão de prédios monumentais, que datam de 1300, 1400 e se dispõe imponentes em uma imensidão de jardins esplendorosos. Por todos os lados, estudantes, professores, turistas, anônimos ou não, disfarçando em vão a perplexidade diante de tamanha grandeza cultural.
Infelizmente, Oxford é para poucos, "é só pra quem pode"... Para quem escolhe Oxford para estudar inglês ou fazer um curso universitário, deve-se estar ciente de que não só os cursos são muito mais caros do que em outras cidades de UK, mas também todos os outros custos. Ainda paga-se caro parar andar de ônibus e para comer. E não é só estudante que sofre; o turista também pena. Fiquei num hotel de brasileiros, o Galaxie, simpático, porém, simples, com uma das menores tarifas: 90 pounds por quarto por noite. Além da hospedagem salgada, a maioria das atrações também é bem paga, com exceção do Ashmolean Museum e das igrejas.
Pois é, como a maior parte das cidades de UK, Oxford não é para todos os bolsos; mas nesse caso, apertar o bolso pode significar engrandecer a alma, e isso, todo mundo pode!
**O Megabus chega na Water Eaton Park Ride, uma micro rodoviária que fica meio fora da cidade. Para ir para o centro, ou chegar na Bunbury Road - onde há muitos hotéis -tome o ônibus 500, um verdinho , que sai dalí a cada 15 minutos e custa 1,40 Libras pelo trajeto!
Um pouco de Oxford...
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